Olá meninas, bom dia.
Nosso encontro hoje celebra a reportagem de Julia
Baptista, especial para o iG com o tema: "Gordofobia" na vida real.
A matéria propõe conhecer mulheres que enfrentam o
mesmo drama vivido por Perséfone, a enfermeira discriminada por ser obesa em
"Amor à Vida"
Vamos ver os detalhes.
Perséfone, personagem da atriz e comediante Fabiana
Karla, começou sua história na novela global "Amor à Vida" com um
objetivo básico: perder a virgindade. Na faixa dos 30 anos, Perséfone tem uma
vida financeira e profissional estável: é enfermeira e mora em seu próprio
apartamento. Mas, para manter-se bem relacionada socialmente e continuar
buscando a felicidade no amor, Perséfone é obrigada a aturar piadas cada vez
menos engraçadas -- e mais criticadas -- sobre seu peso.
Nas redes sociais, a discriminação tem até nome:
“gordofobia”.
Segundo dados de 2009 do IBGE, 12,4% de homens e
16,9% de mulheres brasileiros sofrem de obesidade.
A obesidade é uma doença multifatorial
caracterizada pelo excesso de gordura no corpo – 30% nas mulheres e 20% nos
homens. Estes fatores podem ser genéticos, biológicos (alterações metabólicas),
ambientais, evolutivos e comportamentais.
“Ainda que com menos intensidade do que se imagina,
os fatores psicológicos ou psiquiátricos aparecem na maioria dos casos”,
esclarece Adriano Segal, psiquiatra do Ambulatório de Obesidade e Síndrome
Metabólica do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo e diretor do
Departamento de Psiquiatria e Transtornos Alimentares da ABESO (Associação
Brasileira para o Estudo da obesidade e Síndrome Metabólica).
Sonia* é uma frequentadora do grupo de apoio
Comedores Compulsivos Anônimos (CCA). Em reunião acompanhada pelo Delas, ela se
levanta e conta que uma depressão profunda, depois que perdeu os pais, a fez
engordar muito mais -- e em pouco tempo. O excesso de peso prejudicou todas as
suas tentativas de conseguir emprego.
“Minha vida andou para trás”, ela diz.
Conta que um primo se mudou para a casa onde vivia
com os pais e passou a agredi-la verbalmente. Em pouco tempo, a convivência
tornou-se insuportável. Dentro de casa, era chamada de gorda, de inútil. Na
rua, idem.
“Levei todos os meus problema para a comida”.
Endividou-se no cartão de crédito por conta de
gastos com padaria e supermercado. A questão financeira virou uma bola de neve.
Retornava à irmandade depois de dois anos afastada. Estava no limite.
“Sei que nasci com a estrela que não brilha, não
casei nem tive filhos. Mas quero parar de sofrer”. Espera que, agora que
conseguiu voltar a frequentar o grupo, as coisas comecem a mudar.
Uma pesquisa da empresa de recrutamento Catho
Online com profissionais de alta gerência apontou que, dos 16 mil
entrevistados, 59,1% admitiram ter algum tipo de objeção na hora de contratar
funcionários obesos. E cada ponto a mais no Índice de Massa Corporal (IMC), que
determina o equilíbrio entre peso e altura, representa R$ 92 a menos no salário
em relação aos salários de colegas mais magros.
Julia Baptista
Simone tem 25, é modelo, sempre usou as roupas que
quis, não tem qualquer problema de saúde – relacionado ao peso ou outro – faz
exercícios físicos regularmente, drenagem linfática e cuida da alimentação. É
linda, loira e de bem consigo mesma. Mas isso não a impediu de passar por
situações discriminatórias.
Uma vez tentou ser Miss ABC. Como no regulamento
não havia nenhuma restrição relacionada a medidas, tentou se inscrever no
concurso, mas não conseguiu. Questionou a organização, não teve resposta. No
ano seguinte, o regulamento foi modificado e uma série de informações sobre o
manequim e as medidas máximas permitidas para os participantes foram incluídas.
Em outra situação, Simone teve de recorrer à
policia e fazer um boletim de ocorrência. Entrou em uma loja para comprar uma
blusa. “Não tem nada para você”, disparou, logo de cara, a vendedora. Pediu
para falar com a gerente, que riu da sua situação. Simone não teve dúvidas,
‘catou’ um PM na rua, fez queixa e registrou um B.O.
“No mínimo, elas vão pensar duas vezes antes de
fazer isso de novo com alguém”.
Apesar de pontuais, atitudes como a de Simone
ajudam a desatar um pouco o nó da trama formada pelo preconceito e
discriminação.
Preconceito em família
Tábata Vieira, atriz e promotora de eventos de 29
anos, não é uma comedora complusiva, como Sonia*. Seu problema são outros
transtornos alimentares. Durante toda a adolescência, sofreu de ansiedade e
anorexia. Aos 12 anos, começou a fazer qualquer dieta que aparecesse na frente.
“Eu tive um ‘estado’ magra, porém nunca soube que
eu era magra, nunca me senti magra. Chegou aos 55 quilos, com 1,77 de altura.
Ainda assim se sentia gorda".
Um dia, uma amiga, que ela considerava bem magra,
experimentou e não coube em uma calça que Tábata vestia facilmente.
“A partir daí fiquei com medo de engordar e de
emagrecer”.
Além de toda pressão interna, Tábata também sofreu
com cobranças externas, principalmente em casa. Mesmo sendo de uma família com
histórico de sobrepeso, a promotora de eventos enfrentou preconceito dentro da
própria família.
“Meu pai sempre criticou muito a gente [Tábata e o
irmão], não queria que fôssemos gordos. Me chamava de ‘sua gorda’ ”.
Quando emagreceu, no entanto, as provocações não
desapareceram: apenas o tema da crítica mudou e passou a ser sua magreza
exagerada.
Estigma
“O estigma e o preconceito aos quais indivíduos com
excesso de peso são expostos são fortes fatores de estresse”, acrescenta Segal.
“E isso vem acontecendo cada vez mais intensamente e em relação a pessoas cada
vez menos obesas”, acrescenta.
Fatores de estresse podem desencadear quadros
psiquiátricos variados, de acordo com a suscetibilidade individual. Estados
depressivos, ansiosos, além de transtornos alimentares estão entre os mais
frequentemente associados ao excesso de peso.
Autora de “Obesidade: o Peso da Exclusão”
(EDIPUCRS, 2002), a professora da Fundação Universidade Federal das Ciências da
Saúde de Porto Alegre (UFCSPA), Lúcia Marques Stenzel, explica a lógica da
discriminação.
“Quanto mais rejeitamos a obesidade e idolatramos a
magreza, mais produzimos problemas relacionados à alimentação, incluindo a própria
obesidade”, diz. “O obeso, além de discriminado pela sua condição física, é
cobrado para que ‘se transforme’, para que se adapte aos padrões estéticos”.
A cobrança pode vir inclusive dos amigos. É o que
acontece com Perséfone: ao contar para a amiga (magra) que foi pedida em
casamento, ouve de Patricia, vivida por Maria Casadevall: "quem sabe agora
você se anima a fazer um regime".
Um beijão no coração de todas e até amanhã.
Lady Chic
Por
Beth Vasconcelos
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